domingo, 31 de outubro de 2010

Tia sim, professora também! Cartas a quem ama ensinar...

Queria muito que Paulo Freire estivesse vivo, queria muito conversar com ele sobre seu livro Professora sim, tia não (cartas a quem ousa ensinar), gostaria de mostrá-lo a realidade atual, onde crianças pedem “Tia, posso te chamar de mãe?”. Bem, se outrora ele afirmava que chamar professora de tia era uma armadilha ideológica, chamar professora de mãe é o que?

Em seu livro Paulo Freire afirmou:

“A tentativa de reduzir a professora à condição de tia é uma “inocente” armadilha ideológica em que, tentando-se dar a ilusão de adocicar a vida da professora o que se tenta é amaciar a sua capacidade de luta ou entretê-la no exercício de tarefas fundamentais. Entre elas, por exemplo, a de desafiar seus alunos, desde a mais tenra e adequada idade, através de jogos, de estórias, de leituras para compreender a necessidade da coerência entre discurso e prática; um discurso sobre a defesa dos fracos, dos pobres, dos descamisados e a prática em favor dos cambados e contra os descamisados, um discurso que nega a existência das classes sociais, seus conflitos, e a prática política em favor exatamente dos poderosos.”

Eu constantemente desafio meus alunos através de jogos, histórias, leituras, tento fazê-los entender até onde vai a fantasia e onde começa a realidade, sou chamada de tia sim, poderia até chamá-los de sobrinhos, seria mais suave do que chamá-los alunos porque, para quem não sabe, aluno = sem luz , pois é "formada pelo prefixo a-, que significa negação, e pelo elemento lun-, adulteração de lumen, luminis, do latim, que significa luz"... E, por significar "ausência de luz", a palavra é "pejorativa, depreciativa, ofensiva, antipedagógica", e outros palavrões... Mesmo havendo uma vertente que acredita que na verdade o substantivo alumnus, por sua vez, deriva do verbo alere (alo, -is, alui, altum ou alitum, alere. Informações citadas para quem sabe consultar verbo em dicionário latino). Significados do verbo alere: 1. Alimentar, nutrir (sentido próprio e figurado). (Cícero: obra De Natura Deorum). 2. Daí: fazer crescer, desenvolver, animar, fomentar (sentido próprio e figurado). (Cícero: obra Catilinárias) – Fonte: a mesma acima citada. A palavra já existe em latim (muito antes de Cristo...): alumnus, alumni, substantivo masculino da segunda declinação. 1. Sentido próprio: criança de peito. Sentido empregado por Cícero, na obra Verrinas. 2. Daí, sentido figurado: discípulo. Sentido empregado também por Cícero, na obra De finibus. – Fonte: FARIA, Ernesto. Dicionário Escolar Latino-Português. MEC, 1962. Prosseguindo.

Bem, não importa qual a origem etimológica, não somos gregos e tampouco temos aulas de latim, o que importa, ao meu ver, é a significação dada atualmente e aluno = estudante, assim como tia = professora. Embora para os pequenos o significado de tia seja realmente de tia... Em 2008 eu tive um aluno que me surpreendeu, era chegado o período de férias escolares (o recesso do meio do ano) e conversei com a turma que ficaríamos alguns dias sem nos vermos. Esse aluno, Marcos Vinícius, perguntou: “Tia, então a senhora vai lá em casa brincar comigo?” Eu disse: “Não meu querido, eu vou ficar na minha casa e você na sua, vamos tirar férias uns dos outros, voltaremos cheios de saudades e novidades pra contar! Além disso, eu nem sei onde fica sua casa...” Ele disse: “Claro que sabe, você é minha tia!”. Eu disse: “Não Marcos, eu sou sua professora, não sua tia!” Ele disse: “É sim, você é minha tia!”. Eu disse: “Não meu bem, eu não sou irmã do seu pai, nem da sua mãe, sou apenas sua professora!”, ele com lágrimas nos olhos: “ Mas mesmo assim você é minha tia!” E me abraçou como se pedisse “Diga que está só brincando, você é minha tia!”. Naquele dia eu soube que para as crianças pequenas a função de professora realmente se confunde com a de tia. Conversei, então, com a turma toda em “rodinha”, fizemos uma árvore genealógica de cada um (oralmente) e eles viram que eu não faço parte da família de nenhum deles, mas pediram “Mesmo assim podemos te chamar de tia?” e a resposta foi “Claro que sim!”.

Também em 2008, na escola em que eu fazia dupla regência um outro aluno, Michel, perguntou na hora da “rodinha” : “Tia, por que a senhora não arruma um emprego?”, eu dei uma risada e disse: “Mas Michel, eu tenho um emprego, meu trabalho é esse aqui, eu sou professora, eu dou aula pra vocês todo dia!”, ele disse: “Não tia, eu não to falando de ficar aqui brincando com a gente, to falando de um trabalho de verdade. Igual minha mãe, ela dá faxina e passa roupa na casa dos outros!”. Então tive de trabalhar as diferentes profissões, o que cada profissional faz... Mostrei pra eles as coisas que aprenderam comigo e com as outras professoras, quem embora nossas aulas sejam divertidas (e esse também é nosso objetivo), que nosso objetivo, como professoras, não é apenas cuidar deles, brincar com eles, mas ensinar-lhes muitas coisas (letras, palavras, numerais, contas, coisas sobre a natureza, a pátria, o mundo...)!

 
Na verdade, nem sou tia de verdade ainda, só tenho uma irmã e ela ainda não é mãe, está com casamento marcado para o ano que vem, mas pretende fazer muitas coisas ainda antes de ser mãe, então ser tia de verdade só Deus sabe quando serei... Enquanto isso vou sendo “tia” dos meus alunos! Sou “tia” desde os 14 anos, quando fiz meu primeiro estágio, quando era uma normalista idealista...

Trabalhar com criança pequena, como já disse em outro artigo, é muito divertido!

Eu amo o que faço!



Bibliografia:

FREIRE, Paulo. Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. São Paulo: Olho d’ água, 1997.

http://www.revelacaoonline.uniube.br/ombudsman/aluno.html

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Carência afetiva no ambiente escolar

Cada ano que passa as famílias estão mais desestruturadas e consequentemente as crianças mais carentes de afeto, de atenção e de valores.
Quem, como eu, está diariamente em contato com crianças, sabe bem do que estou falando!
O comportamento das crianças, cada dia mais agressivas e sem limites, são apenas sintomas da maneira que elas vêm sendo tratadas no âmbito familiar.
É bem verdade que as famílias precisam parar de acreditar que a escola tem a obrigação de educar. Como minha mãe sempre disse "educação vem de casa", não adianta acreditar que as quatro horas e meia, durante cinco dias na semana, com uma professora e em meio a trinta colegas de famílias, credos e criações tão diferentes, serão capazes de realmente EDUCAR uma criança.
Outro engano que muitos não se dão conta é que CRIAR é muito diferente de EDUCAR.
Criar uma criança é relativamente fácil: dar comida, banho, vesti-la, levá-la para a escola... O difícil é educá-la! Educar significa SABER DIZER NÃO! Educar significa ter trabalho, fazer as regras, impor limites... É uma tarefa árdua, mas que precisa ser feita e feita com amor, com carinho, com dedicação...

sábado, 23 de outubro de 2010

Criança fala cada coisa...

Trabalhar com criança pequena é muito divertido!

Criança pequena é espontânea, ingênua e fala o que pensa sem medo de ser feliz!

Essa semana uma aluna minha, chamada Carolini, estava comendo jujubas e veio com uma para me dar na boca, eu abri a boca e quando comecei a mastigar veio outra aluna e disse "Tia, não come isso não, ela deixou cair no chão!" Daí eu me virei pra Carolini e disse "Poxa Carol, você me deu jujuba do chão?!" Ela disse "Não se preocupa não tia, eu assoprei antes de te dar!". Rsrs - Quem precisa de tratamento de imunoterapia quando se adquire tantos anticorpos assim, tão naturalmente?! rs.

Isso me fez lembrar de um outro episódio, de quando eu lecionava inglês numa escola particular. Era verão, estava muito calor, eu estava com sede, dando aula para uma turminha de 1º ano e uma aluna pediu pra beber água e encher sua garrafinha, eu deixei e lhe dei meu copo e pedi que trouxesse um pouco d' água pra mim, ela prontamente pegou o copo e desceu as escadas (só tinha bebeouro no primeiro andar da escola). Ela demorou muito, quando voltou com água, dei aquela golada boa e perguntei "E então Flavinha, por que demorou tanto? A fila estava muito grande ou você ficou passeando pela escola?" Ela disse "A fila estava grande tia... E todo mundo só queria beber no seu copo!" Rsrs.

Frases como "Tia, hoje eu passei rolão no sovaco" (referindo-se ao desodorante roll-on), me fazem rir muito!

Adoro ser professora, adoro trabalhar com Educação Infantil!

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Funcionários Públicos...

Quando a gente pensa que as coisas vão melhorar...

Eu sou professora do município do Rio de Janeiro, isso não é nenhuma novidade, mas esse ano pela primeira vez o município mandou a nossa escola dois profissionais que estamos sempre a requisitar: uma fonoaudióloga e um psicólogo. Eu pensei "Poxa, até que enfim nossos alunos serão atendidos, os alunos com problemas comportamentais e os com problemas na fala receberão atendimento e muitos de seus problemas de socialização e aprendizado irão se resolver!", mas felicidade de professora dura pouco... Primeiro eu listei todos os meus alunos (ao todo 12 nas duas turmas!) com problemas, não diagnosticados, como hiperatividade, hipoatividade, dislalia etc e enviei a secretaria da escola (fui a primeira professora a fazer isso) e dois dias depois me veio a coordenadora pedagógica e disse que não seria possível atender aos meus doze alunos, a fono e o psicólogo só poderiam atender 20 alunos em toda a escola (nos dois turnos)! Dos meus doze alunos eu enxuguei a lista, por prioridade, e esse número caiu pra 2. Um aluno para o psicólogo e outro para a fono... O atendimento (diagnose) das crianças foi hoje, o psicólogo conversou 15 minutos com a mãe do meu aluno e encaminhou para o psiquiatra, a fonoaudióloga em menos tempo ainda disse ter avaliado meu aluno, que apesar de falar tudo errado, babar, fazer uma visível força pra falar (fica com a veia do pescoço saltada), tem dificuldade de formar frases, ela disse que não tem nenhum problema fonoaudiológico, que o problema dele é imaturidade e ansiedade, jogou a peteca na mão do psicólogo que após conversar com a mãe dele (que é mãe adotiva) disse que o encaminharia ao psiquiatra...
Pelo que eu entendi a fono encaminhou pro psicólogo, este encaminhou pro psiquiatra e... Pra quem será que o psiquiatra vai encaminhar? Será que o município vai ter psiquiatra pra atender esses alunos?
A mãe de uma outra aluna está quase perdendo os seios porque na rede pública de saúde lhe diagnosticaram PANICULITE (inflamação do tecido gorduroso) e ela está desde março fazendo tratamentos, consultas, exames, tomando remédios e nada... Um médico manda pro outro e ninguém resolve o problema dela... Estou levando o nome dela pra oração na igreja, tenho orado muito por ela, ela é uma ótima mãe, uma ovelha do Senhor, creio que Jesus há de lhe dar a benção da cura, só Jesus!

As pessoas sonham em passar em um concurso público, sonham com a famosa ESTABILIDADE, daí passam em algum concurso e se tornam profissionais odiáveis, que parecem trabalhar por obrigação, atendem mal aos outros, fazem os serviços pela metade e ainda reclamam de salário, de reajustes etc. Queira Deus que eu jamais me torne uma funcionária pública assim...

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Ser mestre...

Há quem diga que sou louca por ter escolhido o magistério como profissão, mas eu sei que na verdade foi o magistério quem me escolheu e não o contrário... O magistério me seduziu quando eu era ainda menina, quando via em minhas professoras as pessoas mais inteligentes, idôneas, corajosas e independentes que eu conhecia, na verdade aquelas mulheres eram minhas heroínas...

Em qual outra profissão podemos ver:

P – PSICOLOGIA (a compreensão do ser humano como um todo)

R – REALIZAÇÃO (formar cidadãos)

O – ORGULHO (construir estruturas sólidas para a sociedade)

F – FELICIDADE (ver a mudanças que o conhecimento proporciona)

E – EXPERIÊNCIA (saber que somos melhores que ontem e continuaremos melhorando)

S – SABEDORIA (que vem de Deus para cumprir nossa missão e sacerdócio)

S – SENTIMENTOS (porque somos humanos e tudo que fazemos é com amor, paixão, serenidade, cólera e todos os sentimentos que temos)

O – OPINIÃO (porque somos formadores de opiniões)

R – RENÚNCIA (porque ser professor, muitas vezes, é não ter vida social, é passar final de semana corrigindo provas, preparando aulas...)

Ser professor parece fácil, mas não é uma licenciatura que faz uma pessoa sê-lo. Ser professor não é pra qualquer um... Muitos se formaram comigo, poucos estão atuando na área, muitos ficaram pelo caminho, resolveram fazer outras coisas, mas a verdade é que somente quem gosta do que faz permanece e faz direito, consegue reconhecimento e respeito dentro da profissão!

Eu posso não ter uma estátua numa praça, nem receber um salário maravilhoso, mas confesso que sinto muito orgulho e sou uma pessoa realizada!

Jesus era o Mestre dos mestres, ele ensinava pelos caminhos por onde passava e espero ser assim também, que eu possa ser professora não apenas em sala de aula, mas que por onde quer que eu passe eu possa também ensinar coisas boas, ser exemplo de fé, de determinação e de realização pessoal e profissional!